JAZZ EM PORTUGAL:
• A AUSÊNCIA DE UMA ESTRUTURA ORGANIZADA:
Neste país, inicia-se a construção das estruturas culturais pelo telhado. É notório em diversas áreas, como por exemplo a Banda Desenhada: eventos aglutinadores surgem anualmente (Festivais da Amadora, do Porto, Cartoon Portugal, etc...). Também com maoir ou menor regularidade, são editados álbuns de autores nacionais, por editoras independentes ou departamentos especializados das maiores. Mas quanto à base, ao fermento, à raiz, ou sejam, as revistas periódicas, os fanzines com certa qualidade... nada. Zero. Nicles. Todos os esforços nesse sentido morreram demasiado prematuramente, por razões de diversa índole que não importam, por ora, para este artigo.
Temos, assim, as super-estruturas, as intermédias, funcionando com alguma regularidade, mas total ausência de actividades disseminadas pelo país, na base, no dia-a-dia, fervilhando e potenciando o aparecimento das inovações, das interacções dos criadores entre si e com a sociedade em geral.
O mesmo se aplica ao Jazz: os festivais brotam como cogumelos, de alguns anos para cá
(de Guimarães a Angra, do Seixal a Matosinhos, de Tomar ao Funchal, da Cidade ao Dia de Verão...) Estes representam a super-estrutura, o telhado, o vértice da pirâmide. Séries de concertos são também promovidos, do CCB ao Rivoli, da CulturGeste à Praça da Erva em Viana, etc... Alguns músicos vêem a sua música editada (no caso da B.D. por uma Baleia Azul, no caso do Jazz por um Trem Azul... um dia ainda lhes ponho um processo...), com mais frequência nos últimos anos, felizmente. Estamos assim, na presença e existência das estruturas intermédias.
Mas, na base, onde a actividade, a frequência, os concertos semanais, as Jam sessions, as sessões de divulgação, dever-se-iam multiplicar, acontecer um pouco por todo lado, o panorama deixa imenso a desejar. Um Hot Club e pouco mais na capital, um outro em Alcobaça, Matosinhos e Braga são os locais onde se pratica e se pode "ouver" Jazz. Contam-se pelos dedos... e ainda sobram... dedos e músicos. Muitos. Sem ter onde tocar, numa base semanal, diária. Que seria fundamental. Indispensável.
Nos nossos parceiros comunitários, encara-se o Jazz como uma forma de cultura. Edilidades municipais desburocratizam os licenciamentos, lançam apoios e incentivos favorecendo o surgimento de locais como clubes e bares onde aconteça Jazz ao vivo. Em 79/80, tocava eu na banda da casa, no B 14 Jazz, em Roterdão, e soube pelos sócios/gerentes que a vereação da cultura da cidade lhes fornecia um subsídio de cinco mil contos (!) para auxiliar ao pagamento dos cachets de músicos estrangeiros. Posso citar alguns, que às Sextas e Sábados, actuavam no mesmo palco que nós, HouseBand (4 Holandeses e 1 Português), nas Quartas, Quintas e Domingos. Músicos como Tete Montoliu, Sun Ra Arkestra, Orsted Pedersen, George Adams/Don Pullen, Frank Wright, Buddy Tate, Andrew Cyrille, entre outros. Em Amsterdão, a associação de músicos de Jazz e Improvisada possui umas instalações, a Bim-Huis, que inclui sala de concertos, bar, sala de exposições, secretaria, além de vários mini-estúdios para aulas e ensaios, e um estúdio de gravação. Uma Casa da Música, só para o Jazz! Que tal? Construída vai para 30 anos... Por cá, nem daqui a 30 teremos algo assim.
É inacreditável que a Câmara de Lisboa ainda não tenha arranjado um novo local para o Hot, de modo a poder caber pelo menos um piano de meia cauda no palco, e um pé direito que permita a um trombonista esticar-se à vontade durante o solo...
Rui Azul